Em um passado não tão distante era possível ir para qualquer lugar do mundo, bastava pegar um avião, no entanto, houve uma pandemia no meio do caminho e essa situação mudou.
A Covid-19 obrigou que países fechassem suas fronteiras e recomendassem que seus cidadãos ficassem em casa, com isso as companhias aéreas, que dependem das multidões viajando, foram um dos setores mais atingidos pela crise.
O medo levou ao fechamento das fronteiras e ao cancelamento massivo de voos. No auge da crise, em abril, a demanda por voos domésticos caiu 93%. Já o número de voos internacionais desabou 96%. Em quarentena, as companhias perderam mais de 80% do valor de mercado.
Com base no site Flightradar24, é perceptível a diminuição de aeronaves no ar de janeiro a março. Eis as imagens comparando os dois períodos do ano em relação ao espaço aéreo brasileiro às 9h ( horário de Brasília).
Momentos de turbulência
O investidor que detinha R$ 10 mil em ações de empresas aéreas brasileiras no começo de março. Em menos de um mês, viu seu capital investido se tornar R$ 1,6 mil.
As ações da empresa Azul (AZUL 4) chegaram a cair 83,4%, entre a máxima de R$ 62,41, em 28 de janeiro, e a mínima de R$ 10,35, em 18 de março. Já as ações da empresa Gol (GOLL4) perderam 85,6% de valor, entre o pico de R$ 39,05, em 23 de janeiro, e a depressão de R$ 5,60, também no dia 18 de março.
Vale ressaltar que o setor aéreo não compreende apenas as companhias aéreas, mas também uma série de outros serviços, como agências de turismo, empresas de alimentação, comissariado e, claro, as próprias fabricantes das aeronaves.
Apertando os cintos
Como se o cenário já não fosse caótico, o setor aéreo está exposto aos fatores que transcendem as suas habilidades da gestão. Como a variação cambial do dólar e o preço do petróleo.
É importante ressaltar que as empresas aéreas possuem grandes dívidas em dólar e dependem dos preços dos combustíveis, que também seguem a moeda norte-americana. Com o dólar subindo como nunca antes visto, há elevada perda de faturamento, com aumento da dívida, dos custos e despesas financeiras.
As despesa com combustível corresponde a um terço dos custos operacionais, estando os aviões cheios ou não. Outro terço inclui o gasto com pessoal e leasing, como é chamado o aluguel das aeronaves, que diminui cada vez mais caixa das companhias, mesmo com os aviões parados.
Além disso, as empresas detêm custos fixos elevados, a aviação exige mão de obra super especializada, o que na crise torna difícil dispensar profissionais para recontratar quando o cenário for melhor.
O transporte aéreo sempre foi uma indústria de margens muitíssimo apertadas, na pandemia elas se tornaram ainda mais baixas. Logo, é preciso volume, o grande problema é que não há demanda, consequentemente não há voos e sem voos não há receita.
Da ficção a realidade
Mesmo que vírus seja combatido de uma vez por todas, os efeitos podem ser duradouros na área.
A trama do filme Amor sem Escalas, interpretado pelo ator George Clooney, mostra que não é necessário viajar para diversos cantos do país para resolver problemas corporativos, a tecnologia pode auxiliar e reduzir gastos.
Voltando a nossa realidade, o regime de trabalho home-office, computação na nuvem e videochamadas vieram para ficar, muitas empresas pretendem aderir a esse modelo pós pandemia definitivamente ou parcialmente. Com isso as viagens a trabalho podem mudar para sempre, que consequentemente afetam o business das empresas aéreas.
Por ora, as companhias aéreas preferem acreditar que a diminuição dos viajantes corporativos é momentânea. E que, mesmo com a explosão das videochamadas, o contato físico ainda seria indispensável no mundo dos negócios.
Em meio à tempestade
Para as empresas aéreas colocar as aeronaves de volta no ar é a parte mais fácil, difícil é convencer as pessoas de que aviões são ambientes seguros. Para isso diversas medidas vêm sendo adotadas a fim de impedir a propagação do vírus. Vejamos algumas delas:
Acessório essencial para a proteção contra o vírus, o uso de máscara deverá ocorrer em todo o percurso. Para reduzir a exposição ao risco é recomendada a realização antecipada do check-in, pela internet. A utilização de álcool em gel para a manutenção da higiene pessoal pode ser utilizado durante as viagens aéreas, contudo na bagagem de mão é limitado a 500 ml e nos voos internacionais, os frascos devem ser de plástico transparente e com capacidade máxima de 100ml.
Além disso as as aeronaves da frota brasileira foram melhoradas, hoje elas contam com um sistema de filtragem que renova o ar a cada 3 minutos e captura cerca de 99% das partículas no ar.
Aéreas brasileiras – O futuro a Deus pertence
Um dos mais atingidas pelos efeitos econômicos da pandemia foi sem dúvidas o setor de viagens, no Brasil representado pelas ações das aéreas GOL (GOLL4) e Azul (AZUL4), com colapso em seus papéis. Companhias como Avianca e Latam entraram com pedido de falência nos Estados Unidos.
No consolidado, as três principais empresas brasileiras do setor, Azul, Gol e Latam, registram prejuízo líquido total de R$ 9,7 bilhões no 1º trimestre de 2020, o equivalente a uma margem líquida negativa de 90,8%.
O resultado financeiro acumulado das três no 1º trimestre de 2020 apresentou redução de 1.331,3%, registrando prejuízo de R$ 8,8 bilhões, ante R$ 613,5 milhões em igual período de 2019.
Azul
Antes da pandemia, Azul operava alavancada, administrando dívidas altas. Por um lado, isso amplia as chances de aumentar o faturamento bruto, podendo adquirindo mais aeronaves, por outro, expõe a empresa a maiores riscos. A empresa viu a sua receita cair 85% no segundo trimestre de 2020, no entanto a companhia deu continuidade aos planos de investimentos.
Em maio deste ano, a Azul concluiu a compra da TwoFlex Táxi Aéreo, que possui aeronaves para até 9 passageiros. O investimento de R$ 123 milhões trará flexibilidade para os negócios da Azul, atendendo também no transporte de cargas e vários trechos nacionais ainda sem conexão. Além disso a empresa renegociou com credores e funcionários, garantindo ter liquidez para suportar a 2021.
GOL
Em setembro a GOL apresentou uma geração de caixa na média de 1 milhão de reais por dia, com uma queima média de R$19 milhões, porém com uma receita diária de R$20 milhões. Desta forma a liquidez total da GOL subiu 8% durante o mês de setembro, registrando R$ 2,2 bilhões no final do mês.
No último trimestre a GOL amortizou aproximadamente R$ 1 bilhão em dívidas, sendo que a alavancagem foi de 5x o tamanho do caixa. A empresa também destacou a maior receita gerada com o transporte de cargas, que ajudou a companhia neste complicado período de menor oferta de assentos.
Em outubro a companhia operou uma média de 400 voos diários, além disso, a empresa está operando com menores custos por voo, incluindo o combustível, que teve queda de 16% no valor unitário em comparação com o mesmo período do ano passado.
Para o restante de 2020 a GOL espera um consumo líquido de caixa na ordem de R$ 2 milhões por dia, no entanto, essa situação pode se reverter tendo em vista a segunda onda nos casos de COVID-19 vinda da Europa, em países como França, Espanha e Reino Unido, que podem tornar o isolamento social ainda mais duros.
LATAM
A Latam anunciou redução de 95% dos voos, a companhia estava queimando combustível e a malha nas atuais condições, não paga o custo variável.
A empresa já contava com caixa relativamente curto mesmo antes da crise se configurar, além disso sua negociação com suas respectivas tripulações, reduções de salário e jornada, ocorreram de forma muito lenta. Essa fatores levaram a Companhia ser mais afetada do que as concorrentes.
O socorro do BNDES
A preocupação não deve se ater apenas a resistência de 2020, mas se manter de pé nos próximos anos, com as mudanças que o setor deverá passar. A depender de quanto tempo durar a crise, as empresas chegarão em situação de insolvência absoluta, precisando de acesso a crédito público para sobreviverem à crise do coronavírus.
Todavia, em meio à pandemia, já se passaram meses de negociações entre companhias aéreas e o pool formado por BNDES e os principais bancos privados do país, para a estruturação de um pacote de socorro ao setor. A proposta de financiamento, anunciada no fim de março, é considerada cara e de uso restrito. Os recursos não podem ser usados, por exemplo, para pagar dívidas ou comprar aeronaves.
Conclusão
O setor aéreo foi o mais afetados pela crise do coronavírus. Com uma queda superior a 90% no número de passageiros transportados, as empresas derreteram na Bolsa.
Até o maior investidor e todos os tempos, Warren Buffett, anunciou ter vendido todas as ações de aéreas que possuía. Com a população em quarentena e a redução expressiva do número de voos em todo o mundo, as maiores empresas lutam para se manter de pé.
As viagens terão uma vivência muito diferente daquela que estávamos habituados, com medidas aprimoradas de limpeza, mais serviços de autoatendimento e maior distanciamento social. Mesmo assim, as aéreas acreditam que todo mundo tem suas próprias razões para querer viajar de novo.
Na aviação, é sempre importante ter redundância de sistemas e combustível sobrando. Com caixa, não poderia ser diferente. O business virou, no curto prazo, uma disputa de quem tem mais caixa sobrevive, já que a entrada de dinheiro praticamente secou. Olhando para frente, esperamos céus mais limpos em meio a tempestade e que a decolagem se concretize considerando as dificuldades.