Entra ano e sai ano e o assunto que nunca sai de pauta é inflação no Brasil. Para quem viveu os anos 80, lembra muito bem das maquininhas de remarcação de preços no supermercado e como o país conviveu com a hiperinflação, que chegou a superar 80% ao mês e só foi controlada em meados dos anos 90, com o Plano Real.
Os economistas do mercado financeiro consultados semanalmente pelo Banco Central elevaram, pela 12ª semana seguida, as expectativas para a inflação de 2021.
De acordo com os dados divulgados na segunda-feira (29), pelo Boletim Focus, o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) deve encerrar o ano em 4,81%. Na semana passada, o mercado apontava para uma valorização de 4,71% nos preços. Há quatro semanas, a estimativa era de alta na casa dos 3,87%.
As projeções encontram-se acima do centro da meta de 3,75% definida pelo Conselho Monetário Nacional para 2021, mas ainda na margem de tolerância de 1,5 ponto percentual definida pelo órgão.
Sabemos que uma das principais tarefas dos governos em relação à economia é controlar a inflação. Por isso, recentemente elevou a taxa Selic em 2,75% ao ano.
Mas afinal, por que ela surge e quais os seus efeitos na economia? Vamos conferir!
A inflação
A inflação é o aumento generalizado que acontece nos preços dos bens e serviços em um determinado período. No Brasil, ela é apurada mensalmente e a cada ano, e o seu índice oficial no país é o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), utilizado no sistema de metas para a inflação.
A inflação implica diminuição do poder de compra da moeda, alterando o padrão de consumo dos brasileiros. Dessa forma, se esse padrão se modifica, os componentes do IPCA também serão alterados.
O IPCA
O IPCA é a referência para o regime de metas de inflação no Brasil. Em outras palavras, ele é o responsável pelo cálculo do preço médio necessário, para que se possa comprar um conjunto de bens de consumo e serviços num país.
O IPCA é medido mensalmente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em seu cálculo, são considerados os principais grupos de produtos e serviços:
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alimentação e bebidas;
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vestuário;
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comunicação;
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saúde e cuidados pessoais;
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artigos de residência;
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transportes;
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despesas pessoais;
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despesas com habitação;
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despesas com educação.
Ao todo, o IPCA considera 465 subitens no seu cálculo, tendo em vista que os itens acima possuem vários desdobramentos.
O índice reflete diversas famílias brasileiras que possuem entre um e quarenta salários mínimos. Em seu cálculo, o IPCA considera as regiões metropolitanas de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Vitória, Curitiba, Porto Alegre, Recife, Fortaleza, Salvador e Belém, além das cidades de Campo Grande, Brasília, Goiânia, São Luís, Aracaju e Brasília.
Em termos práticos, quando o IPCA sobe, os itens de consumo do dia a dia costumam sofrer uma elevação de preço, gerando a inflação no período.
Tipos de inflação
Entendemos o conceito de inflação, mas ainda não respondemos a nossa pergunta inicial sobre os seus efeitos. Para que possamos responder, o primeiro passo que devemos dar é entender suas dinâmicas do mercado financeiro e conhecer suas diferenças, percebendo o quanto a demanda e a oferta de produtos, bens e serviços afetam diretamente nesse processo.
Inflação de custos
A inflação de custos ou inflação de oferta, ocorre quando há um aumento dos preços em determinados itens. Nesse tipo de inflação, os principais motivos podem estar ligados ao aumento no câmbio, no custo da matéria-prima, na taxa de juros, entre outros.
Podemos observar este fenômeno no preço dos combustíveis, por exemplo, onde a contínua alta do dólar potencializa a valorização de commodities no mercado externo, como o petróleo, aumentando os custos nas empresas, que por sua vez fazem chegar ao consumidor.
Inflação de demanda
A inflação de demanda não tem relação com o aumento dos custos de produção, mas sim quando há um aumento na procura por determinado produto ou serviço, fazendo com que o preço suba.
Em outras palavras, ela ocorre quando as pessoas, por algum motivo, começam a consumir mais, a ponto de provocar a escassez de determinados itens no mercado.
Um grande exemplo para esse tipo de inflação foi quando o Governo liberou mais crédito para o financiamento de imóveis, como resultado, havia mais pessoas interessadas nos imóveis do que em moradias disponíveis.
Inflação inercial
Diferentemente dos modelos anteriores, a Inflação inercial não está ligada ao aumento dos preços dos insumos, e nem ao crescimento da demanda. Nesse caso, a Inflação inercial está ligada ao que podemos descrever com “memória inflacionária”, ou seja, o histórico da atividade econômica.
Essa memória utiliza os índices que mediram períodos anteriores de inflação e acabam sendo utilizados para corrigir os preços atuais. Dessa forma, uma economia onde os preços são reajustados automaticamente de um período para outro, há a ocorrência de inflação inercial.
Hiperinflação
A hiperinflação é um nível de inflação considerado acima do tolerável. Além da alta elevada dos preços, esse cenário tende a gerar uma forte desvalorização da moeda local e pode gerar recessão econômica.
O Brasil vivenciou fortes momentos de hiperinflação durante a década de 1980, quando ocorreu um descontrole das contas públicas, dívida interna e externa elevadas, por parte do governo.
Além dos impactos na moeda, a hiperinflação pode gerar desabastecimento de produtos, o que pode colocar a economia de um país em uma forte recessão.
Fatores que influenciam diretamente a inflação
Ao contrário do que muitos pensam, a inflação não deve ser simplificada apenas como o aumento dos preços dos produtos e serviços. As consequências das variações na inflação podem ter múltiplas influências, das quais falaremos a seguir.
Taxas de juros
Mencionei no início deste artigo o aumento da Selic, a taxa de juros é um forte instrumento do Governo para o controle da inflação. A queda ou elevação dos juros podem gerar um aumento, ou diminuição do consumo de crédito.
Um aumento no consumo de crédito, com a Selic baixa, estimula a economia na medida que a disposição de gastar geralmente será maior. Em um cenário onde as empresas investiram mais e a economia do país poderia entrar em uma trajetória de crescimento.
Do contrário, um aumento na taxa Selic significa que o dinheiro ficou “mais caro”, dificultando o acesso a ele, tendo em vista que empréstimos, juros do cartão de crédito, cheque especial e financiamentos ficam mais caros.
Aumento nos custos de produção
A inflação ocasionada pelo aumento nos custos de produção está tipicamente associada ao aumento no preço final ao consumidor. Neste caso, o nível de demanda permanece praticamente o mesmo, mas os custos de certos insumos importantes aumentam e são repassados aos preços dos produtos.
O aumento de preços ao consumidor pode acontecer por diversas razões, tais como pressões autônomas ou choques de oferta, ocorridas por crises ou insuficiência de produção em matérias-primas, como petróleo e derivados ou de produtos agrícolas.
Emissão de moeda
O Governo emite mais moeda na intenção de trazer mais liquidez na economia, de modo a serem investidos na produção ou no mercado financeiro, além da possibilidade de irem direto para o consumo.
Dessa forma, a emissão de moeda gera um estímulo à economia que não é acompanhado pela oferta de bens e serviços. Em outras palavras, a emissão faz com que haja mais moeda na economia do que o necessário para o nível de transações.
Como possível resultado, o excesso de moeda em circulação aumentaria os preços e causaria desequilíbrio no sistema financeiro, trazendo efeitos negativos com relação à inflação.
Dessa forma, quando a inflação se torna superior ao aumento de salários, há perda no poder de compra. Do contrário, com mais dinheiro, as pessoas demandam por mais bens e serviços, de forma a sobrecarregar a economia.
Atualmente, podemos observar uma rodada de emissão de moedas em todos os Bancos Centrais do mundo. Essa medida visa pagar as contas e financiar os gastos públicos, na tentativa de minimizar os fortes danos causados pela pandemia.
Todavia, o dinheiro de uma nação corresponde à riqueza real gerada por ela, e não à capacidade de imprimir papéis e cunhar moedas. Caso haja “sobra de dinheiro” é provável que haja desvalorização da moeda e aumento repentino dos preços, que podem ocasionar uma crise hiperinflacionária.
Cenários alternativos de projeção de inflação
Risco fiscal
Quanto mais alta a dívida pública, mais difícil será sua sustentabilidade ao longo do tempo. Desse modo, em certo momento, o Governo não conseguirá rolar a dívida, ocorrendo o que chamamos de “calote”.
Essa ação tem como consequência o aumento da inflação de duas formas, seja nos prêmios de risco e depreciação cambial ou quando o Governo decide pagar suas obrigações através da impressão de dinheiro.
Sendo assim, a preocupação do mercado financeiro com as contas fiscais brasileiras, devido ao aumento vertiginoso da relação dívida pública/PIB é totalmente justificado, e possui influência nas expectativas de inflação.
A deterioração da percepção sobre a situação fiscal com efeitos a partir de 2021 são condicionantes dos indicadores de incerteza, câmbio e prêmio de risco.
Agravamento da pandemia
O aumento da inflação foi impulsionada por diversos fatores, dentre eles a pandemia, que fez com que muitas pessoas ficassem em casa, o que consequentemente aumentou o consumo de supermercado.
Além desse aumento no consumo imediato, muitos países começaram a ter medo de falta de abastecimento, aumentando substancialmente a demanda, ao mesmo tempo, que a oferta não conseguia dar conta. Como resultado, houve um descasamento entre oferta e demanda, gerando um processo inflacionário.
Além disso, tivemos o auxílio emergencial, com parcelas de R$ 600, gerando mais renda às pessoas, que acabaram por esgotar com todos os produtos disponíveis nas prateleiras dos supermercados.
Efeitos da inflação na economia
Os efeitos da inflação na economia estão todos interligados.
A alta dos preços significa perda do poder de compra, dessa forma as pessoas passam a comprar menos, mesmo que tenham o mesmo salário que ganhavam no passado.
Com baixo consumo as empresas passam a produzir menos, no entanto, caso a empresa não consiga reduzir seus custos de produção, ela não poderá passar essa diferença de preço ao consumidor, o que preocupa os empresários.
Como resultado da contenção de gastos e produção menor, a economia começa a dar indícios de contração. Fato esse que gera desconfianças de investidores nacionais e internacionais referente a saúde financeira do país.
Desse modo, eles começam a retirar o seu capital para alocá-lo em ambientes mais estáveis e seguros, onde todos esses fatores irão gerar impactos negativos no PIB do país.
Importante lembrar que os principais componentes do PIB estão relacionados ao consumo das famílias, investimento privado, gastos públicos e saldo da balança comercial. Assim, com consumo e os investimentos sofrendo uma queda, provavelmente haverá uma queda no crescimento econômico.
Conclusão
A pandemia e outros fatores estruturais do Brasil, fizeram com que a inflação aparecesse cada vez mais no segundo semestre do ano passado. A alta de preços em alguns setores, sobretudo na alimentação em casa, fez com que a preocupação sobre o tema voltasse ao radar dos consumidores e do mercado financeiro.
Encerramos o ano de 2020 com inflação de 4,52%, a maior registrada desde 2016. Com a inflação elevada, quem sofre mais sempre são os mais pobres porque estarão sujeitos a variações bruscas de preços para um salário que não tem como acompanhar esta subida.
Em 2021 os cintos da economia brasileira continuam apertados e o país continua longe de sair dessa crise.