O mercado de ações está repleto de indivíduos que sabem o preço de tudo e não sabem o valor de nada. Para que possamos investir em renda variável com consciência, devemos entender que no curto prazo, as oscilações nos preços das ações são imprevisíveis, frutos da especulação e que grande parte do sucesso nos investimentos, vem da capacidade de compreender que as ações acompanham os lucros das empresas no longo prazo. Seguindo essa lógica, as empresas que apresentam os maiores crescimentos e consequentemente lucros, são aquelas com maior potencial de valorização ao longo do tempo.
Quanto vale o crescimento?
Tomando a premissa apresentada acima, devemos nos ater ao potencial de crescimento da empresa e na geração de lucro ao longo dos anos, que consequentemente favorece a alta nos preços das ações.
Aqui os investidores não buscam lucrar com dividendos, nem com as oscilações nos preços das ações no curto prazo. Seu principal foco encontra-se no crescimento consistente das empresas nos últimos cinco a dez anos, a fim de encontrar uma ten-bagger, isto é, uma ação que poderá multiplicar por dez o capital investido, caso as empresas escolhidas venham a ser bem-sucedidas.
Todavia, não basta apenas escolher as empresas que mais crescem. É preciso pagar preços razoáveis por elas. Quando observamos indicadores como os múltiplos P/L (Preço/Lucro) ou P\VPA (Preço/Patrimônio Líquido) de algumas empresas, percebemos múltiplos extremamente elevados, o que para muitos iria significar que a companhia se encontra supervalorizada. A questão é, o crescimento poderia justificar os múltiplos altos de um papel? Qual a proporcionalidade entre o seu real potencial de crescimento referente às suas expectativas de retorno? Vamos descobrir.
Precificando
Para responder essa questão trago ninguém menos que Peter Lynch, um dos investidores de maior sucesso em todos os tempos. Ele sugere resolvermos essa questão utilizando o PEG (Price Earnings to Growth Ratio), em sua tradução, índice de crescimento de ganho de preço. O indicador é calculado dividindo o P/L da empresa pelo crescimento dos últimos anos.
Segundo Lynch, um PEG de 0,5 ou menor é um sinal de uma excelente oportunidade, já um PEG acima de 2, na maioria dos casos, deve ser evitado, ou seja, uma ação que negocia a um P/L de 20, mas que cresce 25% ao ano (PEG de 0,80), por exemplo, pode ser um excelente investimento.
Veja também: O jeito Peter Lynch de investir
Exemplificando
Suponha os seguintes dados para duas empresas hipotéticas, Empresa A e Empresa B:
Empresa A:
Preço por ação = R$ 50
Lucro por ação este ano = R$ 2,17
Lucro por ação no ano passado = R$ 1,96
Empresa B
Preço por ação = R$ 90
Lucro por ação este ano = R$ 2,81
Lucro por ação no ano passado = R$ 1,69
Dadas essas informações, os seguintes dados podem ser calculados para cada empresa.
Empresa A
Relação P / L = R$ 50 / R$ 2,17 = 23
Taxa de crescimento dos ganhos = (R$ 2,38 / R$ 1,96) – 1 = 21%
Razão PEG = 23/21 = 1,09
Empresa B
Relação P / L = $ 90 / $ 2,81 = 32
Taxa de crescimento dos ganhos = (R$ 2,81 / RS $ 1,69) – 1 = 66%
Razão PEG = 32/66 = 0,48
Muitos investidores consideraram a empresa A mais atraente, tendo em vista que ela possui uma relação P/E mais baixa entre as duas empresas. No entanto, comparado à empresa B, ela não possui uma taxa de crescimento alta o suficiente para justificar seu P/E, ou seja, a empresa B está sendo negociada com desconto na sua taxa de crescimento, onde seus investidores pagam menos por unidade de crescimento dos ganhos.
Todavia, apenas crescer não basta, ser maior não necessariamente significa ser melhor, é preciso evoluir. Para que isso ocorra, devemos estar atentos ao lucro, para isso utilizamos o ROE (retorno sobre o patrimônio líquido), que é a divisão do Lucro Líquido pelo patrimônio líquido.
Através dele podemos observar se a empresa está gerando retornos dos investimentos aos seus acionistas e se a operação dos negócios está ocorrendo de maneira eficiente. Em resumo, quanto maior o ROE mais eficiente é uma empresa, gerando mais valor com menos recursos.
Tomando riscos
Independente da modalidade de investimentos que você escolher, investir na bolsa de valores sempre envolverá riscos, ao optar por alocar parte dos seus recursos em empresas de crescimento, significa a possibilidade de pagar caro em múltiplos altos, o que implica em uma expectativa de resultados futuros maior. Caso a expectativa não se concretize em relação ao potencial de entrega da empresa para o mercado, as ações podem cair drasticamente.
Mas fique tranquilo, novamente Peter Lynch, com toda a sua genialidade, nos ensina a mitigar os riscos e ainda adquirir vantagens. Para ele, diversificar não se trata apenas de reduzir o risco, mas funciona como uma forma de aumentar as chances de encontrar os melhores retornos no mercado. Segundo Lynch, o potencial risco não significa abrir mão da enorme capacidade de valorização que esse tipo de empresa oferece.
Caro leitor, para que essa discussão se torne mais elucidativa, imagine que você invista 100 mil reais, igualmente divididos entre 10 ações com alto potencial de crescimento, com múltiplos considerados pelo mercado como “esticados”, mas que você acredita estar em preços razoáveis. Passados 5 anos, 3 ações lhe deram grande retorno, 4 ações ficaram estáveis e as outras 3 ações foram uma verdadeira decepção.
Suponha que os 30 mil alocados nas 3 piores ações foram totalmente perdidos. No entanto, 3 ações multiplicaram seu capital por 10, sendo assim, os 30 mil investidos nelas se tornaram 300 mil. Por fim, nas 4 ações restantes, você obteve apenas rendimento de 5% ao ano, resultando em 51 mil. Os 100 mil investidos se tornaram 351 mil, representando uma rentabilidade de 251% no período, mesmo após a escolha de 3 ações péssimas.
Proponho uma reflexão, tomando o exemplo acima, aceitaria pagar um “preço mais alto” por uma ação se, em contrapartida, ela oferecesse um enorme potencial de crescimento?
Casos concretos
Se ainda não conseguiu responder a minha indagação, vamos aos exemplos reais:
Em 2015 uma empresa de Santa Catarina, especializada em equipamentos eletrônicos, parecia promissora, mas seu múltiplo P/L estava em 22x lucros, quando a média de P/L do Ibovespa estava em apenas 8x lucros.
WEGE3 – Fonte: TradingView
O gráfico acima mostra o lucro (linha verde) e cotação (linha azul) de WEGE3, a queridinha de muitos investidores. Observe o que aconteceu com o resultado (linha verde) nos próximos anos. Com isso as ações se valorizaram 611% desde 2015.
Vejamos outro exemplo:
Em 2017 Magazine Luiza (MGLU3) negociava a 55x lucros, enquanto no mesmo período a mediana na Bolsa era 14x lucros, veja o resultado que a empresa entregou nos anos seguintes e como seu ticket se comportou.
MGLU3 – Fonte:TradingView
O gráfico acima mostra o lucro (linha verde) e a cotação (linha azul) de MGLU3. De 2017 a 2019, a empresa valorizou 389%, conforme os resultados da transformação digital já começavam a aparecer e os lucros da empresa foram subindo.
Creio que o entendimento tenha ficado claro, resumidamente os resultados crescem e as ações sobem. Para atingirmos esses resultados é preciso ir além do além do passado e do presente, é preciso ter visão do futuro, analisando empresas que indicam capacidade na entrega de resultados crescentes, no qual o investidor irá pagar um preço razoável por essa expectativa. Não podemos nos deixar enganar e observar exclusivamente os preços e os resultados atuais, pois eles podem impedir de enxergarmos o valor do crescimento.
Faça sua escolha
Derek Thompson, famoso jornalista americano já dizia “Quando se trata de prever o futuro, a ignorância é um clube do qual todo mundo é membro.”
Você faz as suas escolhas, mas são as suas escolhas que fazem você. Já observamos que essa estratégia possui efeito potencializador sobre o capital investido, no entanto é preciso fazer um alerta, não se trata de prever o futuro, é sobre a importância acompanhar os resultados das empresas e aproveitar a má precificação desse crescimento pelo mercado.
Além disso, é de extrema importância estar sempre atento, a economia é dinâmica e o Brasil não é um país para amadores, por aqui um único tweet pode enfraquecer todo um setor.
As melhores empresas sabem como sobreviver em tempos sombrios e entendem a importância de se reinventarem para continuarem crescendo e mantendo suas vantagens competitivas, para que não tenham o mesmo fim de Cielo.
Faça sua escolha – Crescimento ou valor?
Apesar de ambas estratégias concordarem que os investimentos de longo prazo são as melhores alternativas que conferem resultados aos investidores, as similaridades terminam por aí. Enquanto o investimento em valor busca excelentes empresas com bons preços, olhando para o seu passado, o investimento em crescimento de vislumbrar o futuro, dando preferência às empresas com potencial de exceder exponencialmente seu atual valor de mercado, adquirindo ações mesmo que os preços sejam superiores a seu valor intrínseco.
Caro leitor, se você tem um perfil de risco mais defensivo, tem preferência por investir em empresas sólidas, que custam menos que seu valor real, sugiro focar no investimento em valor. Caso o seu perfil esteja atrelado à maior risco e você busque investir em empresas emergentes, que mesmo acima do seu valor intrínseco, possuem grandes chances de continuarem crescendo, o investimento em crescimento é para você.
No geral, o investimento em valor supera o investimento em crescimento dentro do S&P 500, na maioria dos períodos ao longo da história. Porém, esse cenário vem mudando, as ações de crescimento dos EUA, particularmente no setor de tecnologia, onde os investidores têm preferido as novas e modernas empresas em detrimento das empresas tradicionais, que negociam produtos e serviços mais comuns. Observamos essa mudança no gráfico abaixo.
Growth Investing (linha laranja) / Value Investing (azul) – Fonte: TradingView
Conclusão
A estratégia do investimento em crescimento exige análises bem feitas, muita paciência e apetite ao risco. Seu principal objetivo é comprar excelentes empresas e manter o investimento por vários anos, sem se importar com as oscilações aleatórias do mercado no curto prazo. Contudo, é preciso estar atento com as promessas infundadas, invista apenas em resultados concretos.
A intenção aqui não é repetir o mesmo erro de muitos investidores no passado, que alocam seus recursos na antiga OGX de Eike Batista, promessa ambiciosa de uma nova petroleira, que não chegou a extrair uma única gota de óleo.
Qualquer árvore que queira tocar os céus precisa ter raízes tão profundas a ponto de tocar os infernos, ou seja, investir em ações de crescimento significa poder multiplicar seu capital em 10 vezes, no entanto é preciso estar preparado para as condições de mercado e possíveis reviravoltas.